segunda-feira, 7 de agosto de 2017

As entidades espirituais na Umbanda Omolocô

Por Mário Filho[1]

Muito se questiona sobre os trabalhos espirituais na Umbanda Omolokô, especialmente no contexto de um culto híbrido ou mestiço. A Umbando Omolokô nasce no final doss ano 1940, motivada pelo Tata ti Inkice Tancredo da Silva Pinto , cuja pequena biografia pode ser vista em https://sites.google.com/site/caboclopanteranegra/textos-doutrinarios-e-informativos/tancredo-da-silva-pinto---pequena-biografia-do-incentivador-da-umbanda-omoloco). Tata Tancredo não aceitava o embranquecimento da Umbanda e seu consequente afastamento de suas origens africanas.
Para evitar esse processo de embranquecimento, principalmente após o 1º Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda, realizado em 1941 (análise desse Congresso pode ser vista em https://sites.google.com/site/caboclopanteranegra/textos-doutrinarios-e-informativos/importancia-do-estudo-da-mitologia-africana) Tata Tancredo divulga vários textos, inclusive no jornal carioca O Dia, falando da origem africana que tem a Umbanda e que esta não deve se afastar, nem abandonar sua origem africana.
Ora, sem dúvidas a Umbanda é fruto da mestiçagem e da hibridação, conforme aponta GRUZINSKI[2] (2001, p. 62). Para SILVA FILHO 
ela (Umbanda) é uma mescla de várias tradições mágico-religiosas: catolicismo popular, espiritismo popular, pajelança, culto a divindades africanas (Orixás, Inkices, Bacuros e Voduns) e, hodiernamente, manifestações da Nova Era, tais como cromoterapia, florais, aromaterapia, reiki, contato com seres interplanetários etc.[3]

No entanto, as maiores influências no culto da Umbanda Omolokô são as divindades de origem africana e as entidades do Universo Umbandista e de outras manifestações afro-brasileiras ou afro-ameríndias, tais como o Terecô, o Catimbó-Jurema, a Encantaria, a Barba Soera ou Babaçuê, o Santo Daime, a Barquinha etc.
Num trabalho espiritual da Umbanda Omolokô podem ser vistas entidades de todos os cultos citados anteriormente, sendo que isso não é uma estranheza. Há as entidades clássicas da Umbanda, tais como Preto(a) Velho(a), Criança, Caboclo, Exus e Pombagiras, e de outros cultos tais como os Marinheiros (da Barquinha, Santo Daime e Encantaria); Mestres do Catimbó-Jurema; Encantados da Encantaria (animais que se manifestam mediunicamente: boto, onça, jaguatirica, aves etc, ou seres míticos: sereia, iara etc), Barba Soera (Babaçuê), Terecô etc.
Pode-se afirmar que não existe apenas uma Umbanda, há várias, conforme se pode ver em inúmeros endereços da Internet. A Umbanda Omolokô é uma dessas Umbandas. Academicamente podemos concluir que a Umbanda é fruto da modernidade ou pós-modernidade, em que a individualidade “fala” mais alto. Como afirma SILVA FILHO 
o campo religioso brasileiro, além de mestiço, é sincrético, híbrido e multicultural, fruto de miscigenações variadas, de novas construções e de ressignificações e/ou, talvez, fruto da pós-modernidade, em que a livre escolha e a múltipla pertença sejam a mola mestra das bricolagens que visam a satisfazer as aspirações individuais.[4]

Como se pode ver no sítio de Internet da Federação de Umbanda no Brasil (FUB), temos que a Umbanda Omolokô é a que mais se aproxima do campo religioso afro-brasileiro, pois amálgama, em si, diversas manifestações próprias de sua formação:
Não estamos a julgar esta ou aquela expressão umbandista, nem queremos dizer que a Umbanda Omolokô seja melhor ou pior. Em nossa concepção a Umbanda Omolokô é a mais “honesta”, no sentido de que sua manifestação é a mais próxima daquilo que as entidades que povoam os cultos afro-brasileiros ou afro-ameríndios representam. Na Umbanda Omolocô as entidades não precisam se utilizar dos comportamentos “doutrinados” em que tudo é padrão. Na Umbanda Omolokô as entidades podem se manifestar livremente, e isso é muito desejável. Não são as pessoas que determinam como as entidades devem se manifestar, mas o comportamento ético do médium, que com sua melhora ética cresce espiritualmente, atraindo para si entidades com o mesmo comportamento.[5]




[1]  Sacerdote afro-religioso. É dirigente do Templo Espiritual Caboclo Pantera Negra (Terreiro de Umbanda Omolokô) e do Ilé Ifá Ajàgùnmàlè Olóòtọ́ Aiyé. É Erìnmì Awo da cidade de Ìjágbó, Estado de Kwárà, Nigéria e o Líder (Olórí Ẹbí) da família de Ifá do Àràbà Olúsọjí Oyékàlẹ̀ para o Brasil. Especialista e Mestre em Ciência da Religião (ambas pela PUC/SP), Especialista em História da África e do Negro no Brasil pela UCAM/RJ; Bacharel e Mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública,  pelo Centro de Altos Estudos de Segurança; Especialista em Políticas Públicas de Gestão em Segurança Pública (PUC/SP). Endereço eletrônico: ezezide@gmail.com
[2] GRUZINSKI, Serge. O pensamento mestiço. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
[3] SILVA FILHO, Mário. Campo religioso brasileiro é mestiço. Trabalho apresentado ao Curso de Antropologia da Religião, do Curso de pós-graduação stricto sensu da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2010, pág. 03.
[4] Idem, pág. 04.
[5] Sítio da Federação de Umbanda do Brasil (FBU) em que há a descrição da Umbanda Omolokô. Disponível em: http://www.fub.org.br/artigos/?art=omoloko. Acesso em 11/06/2012.

Introdução à Umbanda Omolocô

Introdução à Umbanda Omolokô[1]
Por Mário Filho*


O Babalorixá Ornato José da Silva afirma, em seu livro, “Culto Omolokô: os filhos do Terreiro”, que a palavra Omolokô é de origem Yorùbá e significa: Ọmọ (filho) e Oko (fazenda). A fazenda, para o autor, seria a zona rural onde esse culto, por causa da repressão policial que havia naquela época (início do século XX), era realizado, ou seja, na mata ou em lugar de difícil acesso, no interior das fazendas dos donos de escravizados.[2] Talvez, por causa disso, possamos teorizar que hoje temos as denominações de "Terreiro" e "Roça" para os lugares onde os cultos afro-brasileiros e de matriz africana são realizados.
Podemos relacionar, também, o significado da palavra Omolokô com o Òrìṣà Oko, Orixá da agricultura ou com o Òrìṣà Irókò, Orixá que habita a árvore de mesmo nome e é cultuado no Candomblé. Segundo se diz, o orixá Oko era cultuado no Rio de Janeiro e era assentado junto com o Òrìṣà Ọṣọ́ọ̀si (Oxossi), pois Oko, assim como Ọṣọ́ọ̀si são caçadores, porém não há dados suficientes que possam confirmar isso.
Outra associação que podemos fazer é a sua relação ao vodun Loko cultuado pelo povo Fon-Jêje, que tem como correspondente yorùbá o orixá Irókò, já citado, e que por sua vez, corresponde ao Inkisi Tempo (Kitembo) na nação Angola de Candomblé. Na época em que os cultos religiosos de origem africana eram proibidos, esse Orixá foi sincretizado a Santo Onofre.
Pesquisas mais recentes dão conta de que a origem do nome Omoloko, também está ligado ao povo Loko. A tribo Loko estava dividida em tribos menores ao longo dos Rios Mitombo, Bênue e Níger, e no litoral de Serra Leoa. Sua cidade principal era Lokoja, que ficava muito próximo ao reino Yorùbá. Crê-se que alguns escravizados do povo Loko, no Brasil, vieram a formar o que alguns chamam de Nação Omolokô.
Segundo Tata Tancredo da Silva Pinto, organizador e o maior incentivador da Umbanda Omolokô, cujo nome iniciático (Sunna[3]) era Fọ̀lkétu Olóròfẹ̀, o culto Omolokô chegou ao Brasil proveniente do sul de Angola, onde era praticado por uma pequena tribo pertencente ao grupo Lunda-Quiôco, que ficava às margens do rio Zambeze, que lhes fornecia alimentação no período das cheias.
Para o músico e escritor Nei Lopes o Omolokô seria um
antigo culto banto cuja expansão se verificou principalmente no Rio de Janeiro, na primeira metade do Séc. XX. O nome liga-se provavelmente ao quimbundo muloko, “juramento”; ou ao suto, moloko, “genealogia”, “geração”, “tribo”. Na Angola pré-colonial, Nganga-ia-Muloko era o sacerdote encarregado da proteção contra os raios.[4]

Podemos afirmar, então, que o nome Omolokô define um culto originário do Rio de Janeiro com práticas rituais e de culto aos Orixás, Bacuros/Inkices ou Voduns e que possui, também, culto aos Caboclos, Pretos-velhos, Exus e demais Entidades Espirituais da Umbanda em geral e outras entidades encontradas no Catimbó-Jurema, Toré, Babaçuê, Tambor de Mina etc.
O culto Omolokô é apontado por estudiosos do assunto e praticantes como um dos principais influenciadores da formação da Umbanda africanizada ao lado do Candomblé de Caboclo, da Cabula e do próprio Candomblé.[5]
Em que pese essa ligação principal com o Rio de Janeiro, sabe-se que o Omolokô
organizou-se principalmente em algumas regiões do sudeste do país, que forneceram grande contingentes de migrantes para a capital do Estado da Guanabara. [...] O Omolokô era forte na zona da mata mineira, em todo o estado do Rio, no nordeste paulista e em parte do Espírito Santo – sobretudo nas áreas rurais. As correntes migratórias internas teriam trazido (ou reforçado) essa modalidade de religião afro-brasileira para o Rio de Janeiro – e elas existiam também em outras partes da cidade: Luiz Edmundo (1987, pp. 72-73), por exemplo, relata a existência, no início do século XX, de um Terreiro na antiga travessa do Castelo, comandado por um certo João Gamba, natural de Luanda, cujos rituais apresentavam formas muito semelhantes de incorporação e ressignificação de diferentes matrizes religiosas.[6]

No culto Omolokô as divindades possuem nomes em língua Yorùbá, Fon-Ewe ou Congo-Angola. Na maioria dos Terreiros Omolokô há o culto aos Orixás, em semelhança ao Candomblé Ketu, por isso são utilizados os Oríkì (poemas laudatórios, que mencionam os valores, atividade e importância de um Orixá, Rei, autoridade etc) para homenageá-los. Os Orúkọ (nomes iniciáticos) são dados por meio da consulta ao Jogo de Búzios. Seus "assentamentos" são semelhantes aos feitos no Candomblé e os Exus são feitos em argila, à semelhança de um busto de uma pessoa, ou então, simbolicamente, em ferro.
Tata Tancredo afirmava que “a Umbanda é [gn] africana, é um patrimônio da raça negra” e que achava graça quando ouvia os “líderes da Umbanda Branca dizendo que a religião [apenas] sofre influência das tradições africanas”[7]. Para ele, a Umbanda é um culto de origem africana e esse viés africanista da Umbanda pode ser visto em uma de suas afirmações: “Terreiro de Umbanda que não usar tambores e outros instrumentos rituais, que não cantar pontos em linguagem africana, que não oferecer sacrifício de preceito e nem preparar comida de santo, pode ser tudo, menos Terreiro de Umbanda.”[8] Para afirmar a característica africana da Umbanda e dar uma formação intelectual aos praticantes do Omolokô, organiza no Rio de Janeiro o primeiro curso de língua e cultura Iorubá.
Na Umbanda Omolokô há iniciação para Orixá, Vodun ou Bacuro, com recolhimento do iniciando à “camarinha” por um período não inferior a três dias. Além da chamada divindade tutelar, que é assentado primeiro, o membro de um Terreiro de Umbanda Omolokô é iniciado para mais duas outras divindades, que farão parte do “enredo” espiritual do adepto.
Há, também, a consagração para as entidades espirituais com as quais trabalharão, que serão firmadas ou assentadas.
Várias casas de Umbanda, cujas formas de culto são consideradas de cunho africanista, originaram-se do culto Omolokô, ou das antigas Casas de Macumba que, mais tarde, foram reconhecidas como praticantes do culto Omolokô, especialmente depois da divulgação de suas práticas nos livros escritos por Tata Tancredo da Silva Pinto. Essas Casas mantiveram uma estrutura de culto aos Orixás, em harmonia com os guias espirituais.[9]
Sobre a Umbanda Omolokô, podemos ver no sítio de Internet da Federação de Umbanda do Brasil (FUB) a seguinte afirmação:
Não objetivamos afirmar que a Umbanda Omolokô seja a melhor ou a pior. Em minha concepção a Omolokô é a mais “original”, no sentido de manifestações, é a que mais se próxima daquilo que as entidades que povoam os cultos afro-brasileiros ou afro-ameríndios representam. No Omolokô as entidades não precisam se utilizar dos comportamentos “doutrinados”, em que tudo é padrão. As entidades podem se manifestar livremente e isso é muito desejável. Os Babalorixás e Yálorixás não determinam como as entidades devem se manifestar, apenas determinam como deve ser o comportamento ético do médium, colaborando com seu crescimento espiritual, atraindo para si entidades de Luz.[10]
  


[1] Esse texto foi escrito em 2012 e revisado e corrigido em 2017, por mim, Mário Alves da Silva Filho.
* Sacerdote afro-religioso, dirigente do Templo Espiritual Pantera Negra e do Ilé Ifá Ajàgùnmàlè Olóòtọ́ Aiyé. Especialista e Mestre em Ciências da Religião, pela PUC/SP; especialista em História da África e do Negro do Brasil, pela UCAM; especialista em Políticas Públicas de Segurança Pública, pela PUC/SP;  Bacharel e Mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, pela APMBB. Endereço eletrônico: ezezide@gmail.com
[2] SILVA, Ornato José da. Culto Omoloko: os filhos do Terreiro. Rio de Janeiro: Rabaço Editora, 1980.
[3] Palavra de origem árabe que quer dizer tradição. Na Umbanda Omolokô se percebe a influência dos malês (muçulmanos negros escravizados)
[4] LOPES, Nei. Enciclópedia brasileira da Diáspora Brasileira. São Paulo: Selo Negro, 2004, p. 497.
[5] OMOLU, Caio de. Umbanda Omolocô: liturgia, rito e convergência. São Paulo: Ed. Icone, 2002.
[6] CUNHA, Mª. Clementina Pereira. Não tá sopa: sambas e sambistas no Rio de Janeiro, de 1890 a 1930. Campinas: Ed. UNICAMP, 2016, s/p.
[7] FREITAS, Byron Torres de & PINTO, Tancredo da Silva. Camba de Umbanda. Rio de Janeiro: Editora Souza, 1956.
[8] Idem.
[9] OMOLU, Caio de. Op Cit.
[10] Disponível em: http://www.fub.org.br/artigos/?art=omoloko. Acesso em 11/06/2012.


sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Tata Tancredo da Silva Pinto: pequena biografia do incentivador da Umbanda Omolocô

Tata Tancredo da Silva Pinto: pequena biografia do incentivador da Umbanda Omolokô

por Mário Filho·

Esse texto foi escrito em 2010 e reescrito agora, tendo por base os Estatutos da "Sociedade Instituto Sanatório Espiritual do Brasil" e de várias outras fontes.


Tancredo da Silva Pinto, escritor, compositor, sambista e umbandista brasileiro, nasceu em 10 de agosto de 1905 no município de Cantagalo, então Estado da Guanabara. Ainda na adolescência veio para o município do Rio de Janeiro.
Tancredo da Silva Pinto, Tata Ti Inkice, é considerado o organizador do culto Omoloko no Brasil e o responsável direto pela reunião dos adeptos dos cultos afro-brasileiros em Federações Umbandistas para defender o seu direito de ter e cultuar uma religião afro-brasileira. Seu nome religioso (Sunna[1]) era Fọ̀lkétu Olóròfẹ̀. Foi chamado, muitas vezes, de o “Papa Negro da Umbanda”.
Tancredo, apesar de ter ficado famoso pelo grau sacerdotal “Tata” (pai), utilizado nos Candomblés Angola para designar o Sacerdote, Tancredo da Silva Pinto, na hierarquia da Umbanda Omolokô, era tratado por Babalaô (do Yorùbá, Babaláwo).
Era filho de Belmiro da Silva Pinto e de Edwirges de Miranda Pinto, sendo seus avós maternos Manoel Luis de Miranda e Henriqueta Miranda. Sua árvore genealógica remonta a grandes praticantes de Religiões Tradicionais Africanas.
Seu avô foi fundador dos primeiros blocos carnavalescos, tendo fundado os blocos "Avança" e "Treme-Terra", bem como o "Cordão Místico", uma mistura de samba de caboclo com o ritual africano, em que sua tia, Olga, saía vestida de "Rainha Jinga".
Seu pai, Belmiro, era considerado o melhor tocador de violão de sua época e tinha em seu histórico o título de excelente ferrador, bem como de exímio tratador de animais, sendo ainda criador de pássaros de diversas qualidades.
Em 1950, devido a grandes perseguições aos umbandistas nos mais diversos Estados da União, assim como no antigo Distrito Federal, fundou a Federação Espírita de Umbanda, com a qual rompe em 1952. Viajou por quase todo o país, fundando filiais da Federação com o objetivo de organizar e dar personalidade à Umbanda. Fundou Federações nos seguintes Estados: Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Pernambuco, entre outros. Criou, para melhor mostrar seu culto de Umbanda ao povo em geral, as seguintes Festas Religiosas: Festa de Yemanjá, no Rio de Janeiro; Yaloxá, na Pampulha - Belo Horizonte (MG); Cruzambê, em Betim (MG); Festa de Preto Velho, em Inhoaíba (RJ); Festa de Xangô, em Pernambuco; organizou e coordenou o evento "Você sabe o que é Umbanda" no Estádio do Maracanã, RJ, e finalmente a Festa da Fusão, realizada no centro da Ponte Rio-Niterói, quando houve a união do Estado da Guanabara com o do Rio de Janeiro.
Segundo Tancredo da Silva Pinto, a primeira sociedade umbandista criada para defender os direitos dos umbandistas no Rio de Janeiro e no Brasil foi a "União", fundada em 1941. Segundo ele, naquela época, devido às perseguições policiais, os cultos eram acompanhados por bandolim, cavaquinho e órgão, porque não era permitido tocar tambores (atabaques). No Rio de Janeiro, os cultos afro-brasileiros foram professados dessa maneira até 1950.
O motivo que levou Tancredo a criar federações umbandistas para defender os direitos dos cultos afro-brasileiros desenrolou-se na casa de santo de sua tia, Olga da Mata, a qual foi narrada por ele:
Esse episódio passou-se na casa da minha tia Olga da Mata. Lá arriou Xangô, no terreiro São Manuel da Luz, na Avenida Nilo Peçanha, 2.153, em Duque de Caxias. Xangô falou: – Você deve fundar uma sociedade para proteger os umbandistas, a exemplo da que você fundou para os sambistas, pois eu irei auxiliá-lo nesta tarefa. Imediatamente tomei a iniciativa de fazer a Confederação Umbandista do Brasil, sem dinheiro e sem coisa alguma. Tive uma inspiração e compus o samba General da banda, gravado por Blecaute, que me deu algum dinheiro para dar os primeiros passos em favor da Confederação Umbandista do Brasil.[2] 

Depois desse fato, Tancredo fundou a Confederação Umbandista do Brasil, usando parte do pagamento recebido pelo direito autoral do samba "General da Banda" (fazendo uma alusão ao Orixá Ogun), gravado por Bleckaute, e ajudou a fundar, em outros Estados, novas federações umbandistas, a fim de defender os direitos dos cultos afro-brasileiros. Ele afirmava que a Confederação Umbandista do Brasil, fundada em 1952, foi criada “com a finalidade de restabelecer a tradição antiga, em toda sua força e pureza primitiva”[3], ou seja, a origem africana da Umbanda.
Foi significativa a posição de Tancredo da Silva Pinto contra as propostas de desafricanização da Umbanda, divulgadas nas palestras do 1º Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda (1941). Tancredo dizia que achava graça quando ouvia os “líderes da Umbanda Branca” dizendo que a religião sofre influência das tradições africanas. Para ele “a Umbanda é africana (gn), é um patrimônio da raça negra” (FREITAS e PINTO, 1957, p. 58). Esse viés africanista da Umbanda pode ser visto em uma de suas afirmações: “Terreiro de Umbanda que não usar tambores e outros instrumentos rituais, que não cantar pontos em linguagem africana, que não oferecer sacrifício de preceito e nem preparar comida de santo, pode ser tudo, menos Terreiro de Umbanda.”[4]  Para afirmar a característica africana da Umbanda e dar uma formação intelectual aos praticantes do Omolokô, organiza no Rio de Janeiro o primeiro curso de língua e cultura Iorubá.
A pesquisadora Stefani Capone nos fala sobre essa dicotomia Umbanda-Branca e Umbanda-Africana e o papel de Tata Tancredo:
A partir dos anos 1950, várias outras federações de Umbanda foram criadas no Rio de Janeiro. Três delas reuniam os centros que se reconheciam na umbanda branca como o de Zélio de Moraes ou a Tenda Mirim de Benjamim Figueiredo.  Esses centros não aceitavam o uso de atabaques, os sacrifícios de animais, nem qualquer mistura com o Candomblé. As três outras federações defendiam uma forma de Umbanda de orientação africana. A mais importante delas foi a Federação Espírita Umbandista, fundada em 1952 por Tancredo da Silva Pinto, que logo se tornou o porta voz dos praticantes da umbanda "africana", alcançando rapidamente grande popularidade. Ele defendia uma umbanda "popular" que reivindicasse suas origens nas tradições africanas. Tratava-se, pois, do primeiro movimento de volta às origens no meio dos cultos do Rio de Janeiro.
Tancredo da Silva Pinto publicou muitos livros em que apresentou a Umbanda como parte da herança africana. A Umbanda, portanto, começou a se organizar em torno de dois pólos opostos: um formado pela umbanda "branca", influenciada pelo kardecisrno e pelo desejo de criar uma imagem socialmente respeitável e, logo, não-africana; e o outro, pela Umbanda “africana” que reivindicava seus laços com os cultos afro-brasileiros, tendo os terreiros de Umbanda se distribuído ao longo desse continuum, que ia de uma forma branca a uma forma africana.[5]

Tata Tancredo sempre foi muito polêmico, como podemos ver nessa afirmação:
Hoje, uma vasta onda de mistificação invadiu a Umbanda. Criaram, os intrusos, uma Umbanda branca, uma Umbanda mista, modificaram o ritual sagrado, e, pior, sob o ponto de vista espiritual, introduziram o comercialismo na seita. Escritores improvisados publicaram livros cheios de erros e fantasias, servindo a Umbanda de capa a atividades inteiramente comerciais. Para completar a mistificação, pessoas que nada conhecem dos mistérios de Umbanda, que nunca foram Sacerdotes, que nunca fizeram ‘cabeça’, abriram centros e tendas, montaram consultórios luxuosos, onde os clientes são atendidos mediante fichas numeradas.[6] 

Tancredo instituiu as festividades à Iemanjá no Rio de Janeiro - RJ, à exemplo das festividades que aconteciam em Salvador – BA. As primeiras aconteceram na mesma data que na Bahia, 02 de fevereiro, mas com o tempo elas passaram a ser feitas no dia 31 de dezembro.

Tata Tancredo foi um dos fundadores da União de Escolas de Samba, em 1935, que organizaria os desfiles sob o patrocínio de Pedro Ernesto. Em 1936 se torna sócio-fundador da União Brasileira de Compositores. Torna-se, também, sócio da Ordem dos Músicos do Brasil. Criou o samba de breque com Moreira da Silva e ideou a lei que instituiu o enredo exclusivamente nacional. Ator de cinema na antiga Cinédia e jornalista, fundou a revista “Mironga”. Gravou muitos pontos cantados de Umbanda, que ficaram famosos nacionalmente. Além do célebre samba “General da Banda”, compôs vários outros, inclusive em parceria com Zé Kéti. 
Tata Tancredo tinha uma coluna semanal no jornal “O Dia”, de maior circulação no Rio de Janeiro, na qual desenvolvia um trabalho de divulgação da Umbanda, recomendando que sua prática deveria sempre estar atrelada às origens africanas. Escreveu durante 25 anos essa coluna.
A pesquisadora Diana Brown, que pesquisou a Umbanda no Rio de Janeiro, surpreendeu-se com a fama e popularidade que possuía Tancredo nas classes mais baixas das populações cariocas. Muitas pessoas, segundo a autora, mencionavam o nome de Tata Tancredo e muitos Terreiros de Umbanda que existiam nas periferias cariocas que eram filiados à Confederação de Umbanda do Brasil. Segundo a pesquisadora, ainda, Tancredo mantinha alianças com outros líderes umbandistas, “com os quais articulava uma posição africanista para a Umbanda, demonstrando forte antagonismo para com os líderes da chamada Umbanda Branca.”[7]
 Sempre contou com o apoio e compreensão das autoridades civis, militares e eclesiásticas nos seus empreendimentos. Dentre os seus contatos e estreitos relacionamentos políticos destacam-se o Governador Chagas Freitas, Negrão de Lima, Deputado Átila Nunes, o Chefe da Casa Civil Golbery do Couto e Silva, Deputado Marcelo Medeiros e Deputado Miro Teixeira, etc. Mantinha proximidade muito grande com Mãe Senhora (Ọ̀ṣun Mìwà), terceira Ialorixá do Ilê Axé Opô Afonjá (a segunda Casa de Candomblé Ketu do Brasil).
O antropólogo Marco Aurélio Luz nos conta que Tata Tancredo prestou homenagem a Mãe Senhora, em uma festividade no Maracanã, em 1965, escolhendo-a como a “Mãe Preta do Brasil”, erigindo-lhe estátua numa Praça em Campo Grande (Rio de Janeiro). Nessa praça, segundo o autor, Tata Tancredo “realizava o encontro de centenas de terreiros em homenagem aos ancestrais, conhecidos na Umbanda como Preto Velho”.[8] 
Em vida ainda recebeu diversas comendas e homenagens pelos serviços prestados às religiões afro-brasileiras. Especialmente como fiel defensor da prática africanista no culto de Umbanda: o Omolokô. Recebeu em Sessão solene da Câmara Estadual do antigo Estado da Guanabara, o título de Cidadão Carioca, pelos serviços prestados em favor do povo. Teve publicada mais de 30 obras literárias, divulgando a Umbanda e o Omolokô. Foi fundador e colaborador de diversos jornais e revistas destinadas a esclarecer e orientar os adeptos da religião afro-brasileira. O humilde e analfabeto estafeta dos correios “escreveu” diversas obras de cunho umbandista e manteve colunas diárias, algo impensável!
Protagonizou uma série de debates com outro intelectual umbandista W.W. da Matta e Silva (o fundador da Umbanda Esotérica). Para Tancredo a Umbanda tem raízes na África, que teria se desenvolvido, à exemplo do Candomblé, nos quilombos e nas senzalas. Matta e Silva não concordava com isso e preferia o embranquecimento da Umbanda, tirando, em grande parte, a influência da África na Umbanda. A Umbanda Esotérica (ou Iniciática) propugna as mesmas conclusões do 1º Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda, que a Umbanda é um fenômeno que não possui ligações com a África, mas sim com Lemúria, Atlântida, Índia, ou seja, com qualquer coisa menos com a África. Percebe-se, assim, o grande preconceito que há contra a influência africana na Umbanda. Uma análise melhor sobre isso pode ser visto em nosso texto no endereço: http://sites.google.com/site/caboclopanteranegra/textos-doutrinarios-e-informativos/importancia-do-estudo-da-mitologia-africana.
O que nos chama a atenção é que nas Umbandas que são refratárias às influências africanas os Sacerdotes se utilizam de nomenclaturas africanas para designarem seus cargos e postos, tais como Babalaô, Babalorixá, Babá, Cambono, Ogã etc.
Tata Tancredo faleceu em 01 de Setembro de 1979, sendo sepultado no dia seguinte às 15:00hs, na quadra 70, carneiro 3810 do Cemitério de São Francisco Xavier, à Rua Pereira de Araújo, nº. 44, Rio de Janeiro. As despedidas ao seu corpo foram realizadas no Ilê de Umbanda Babá Oxalufan, situado a Avenida dos Italianos nº.1120, em Coelho Neto, onde seu corpo foi velado. No livro de registro de filhos de santo estão registrados mais de 3.566 filhos de santos que foram iniciados por Tata Tancredo.
O Sirum (Axexê), cerimônia de encomenda do corpo de pessoa falecida, foi realizado por José Catarino da Costa, conhecido como Zé Crioulo, filho de Xapanam[9] e confirmado como Ogã no Terreiro de Tio Paulino da Mata e Tia Olga da Mata.
Cumpre-nos destacar a preocupação que Tancredo e os diretores de sua Federação tinham com a saúde dos praticantes da religiões afro-brasileiras, tentando por dez anos construir o Hospital da Umbanda. Para tanto conseguiram a doação de um amplo espaço, mas, infelizmente, não se conseguiu a construção do Hospital. Essa foi uma das maiores decepções de Tata Tancredo, entre tantas outras, ao longo de sua vida.
Uma das curiosidades de Tancredo, segundo o pesquisador, escritor, músico e compositor Nei Lopes é que ele teria sido Pai de Santo do “bispo” Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus.[10] Nei Lopes publica um artigo, que aborda a biografia de Tata Tancredo e seu envolvimento com o samba. Em seguido, colocamo-lo na íntegra:

TANCREDO, O GENERAL DA BANDA
No carnaval de 1950, um samba diferente ganhava as ruas, na voz do saudoso cantor Blecaute. Constava quase que só de um refrão (Chegou general da banda ê ê! Chegou general da banda ê á!) tirado talvez de uma cantiga de umbanda ou do repertório das batucadas que animavam o antigo jogo da pernada carioca, primo-irmão da capoeira. Levava as assinaturas de Sátiro de Melo, Tancredo Silva e José Alcides. E fez tanto sucesso que seu intérprete passou, a partir daí, a apresentar-se, nos shows carnavalescos, envergando uma vistosa fantasia de talhe militar. Mas “general” mesmo foi o co-autor Tancredo. General do samba, da umbanda e das causas populares.

Arte e Música
Tancredo da Silva Pinto nasceu em Cantagalo, RJ, em 1904. “Tata de inquice”, ou seja, pai-de-santo, da linha do Congo e do rito omolocô, em 1949 fundou a Confederação Umbandista do Brasil e durante sua existência publicou vários livros sobre a doutrina umbandista. Em música, Tancredo é também co-autor, com Davi Silva e Ribeiro Cunha, de outro clássico: o samba Jogo Proibido, gravado em 1937 por Moreira da Silva e tido, quase unanimemente, como o primeiro samba de breque. Dez anos depois, destacando-se como líder, ajudava a fundar a Federação Brasileira das Escolas de Samba.
Em janeiro de 1950, o jornal Quilombo, dirigido por Abdias do Nascimento e voltado para a comunidade negra, publicava matéria intitulada ‘Os compositores populares defendem os seus interesses’. E nela dava conta da fundação da ‘Escola de Samba Arte e Música’, por iniciativa de Tancredo e seu parceiro José Alcides.
A ‘Arte e Música’, segundo seus fundadores, era uma sociedade de âmbito nacional e suas realizações deveriam repercutir até no estrangeiro. Seu objetivo era divulgar a música popular tipicamente brasileira. E, para tanto, ela pretendia criar departamentos autônomos e especializados para cada setor, nomeando representantes estaduais, e estabelecendo núcleos de ‘arte e música’ pelas principais cidades brasileiras, com vistas a intenso intercâmbio de experiências artísticas.
A escola de Tancredo pretendia também divulgar, a partir do Rio e através do rádio, do disco, do teatro musicado e de partituras impressas, as criações de autores desconhecidos do interior do Brasil. E se dispunha a, mediante contrato, colaborar com as firmas produtoras de ‘películas cinematográficas, fornecendo-lhes artistas, extras e compondo música popular’ – conforme declaração de Tancredo Silva.
Firme em seus objetivos, a instituição pretendia tão somente atuar no mercado de trabalho e não fazer benemerência: ‘É preciso não esquecer que constituímos uma entidade de arte e cultura e não de assistência social.’ – afirmava um de seus dirigentes ao jornal Quilombo. ‘Contudo não podemos fechar os olhos aos problemas de caráter grave e urgente. Mantemos um socorro social com a finalidade de atender às necessidades básicas e às situações aflitivas dos nossos associados’.
Tancredo Silva Pinto faleceu no Rio em 1979. Três anos antes recebia honrarias da câmara de vereadores do município de Itaguaí. E, em 1974, realizava na ponte Rio-Niterói, na condição de sacerdote da umbanda e com respaldo governamental, ritual propiciatório da fusão entre os antigos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro. E dois anos antes da passagem do líder para a Outra Dimensão, era fundada, no bairro da Abolição, na antiga Avenida Suburbana, numa loja onde antes funcionava uma funerária, a chamada ‘Igreja Universal do Reino de Deus’, criada, segundo consta, por um dos filhos-de-santo do respeitado tata (e bamba).
Líder do samba, dos cultos afro e de parte do segmento autoral musical, foi de fato um comandante. Sobre sua inusitada escola de samba, pouco se sabe. Mas seu ideário, antecipando muita coisa boa que efetivamente veio, anos depois – como o Projeto Pixinguinha, as gravadoras independentes e até mesmo alguns princípios defendidos pela SOMBRÁS e pela nossa AMAR – fez dele um legítimo estrategista.
Saravá sua banda![11] 

ALGUNS LIVROS DE TANCREDO DA SILVA PINTO
- Negro e Branco na Cultura Religiosa Afro Brasileira – Os Egbás – Editora Espiritualista – em parceria com Gerson Ignes de Souza
- Tecnologia Ocultista da Umbanda no Brasil – Editora Espiritualista
- A Volta dos Orixás – Editora Espiritualista
- Doutrina e Ritual de Umbanda – Editora Espiritualista
- Primado de Umbanda – Editora Espiritualista
- Guia e Ritual para Organização dos Terreiros de Umbanda – Editora Eco – em parceria e Byron Torres de Freitas
- Doutrina e Ritual de Umbanda – Tancredo da Silva Pinto e Byron Torres de Freitas
- As Mirongas de Umbanda – Tancredo da Silva Pinto e Byron Torres de Freitas
- Tecnologia Ocultista da Umbanda Brasil
- Origens da Umbanda
- O Eró
- Cabala Umbandista
- Iaô
- Camba de Umbanda
- Impressionantes Cerimônias da Umbanda
- Fundamentos da Umbanda


· Sacerdote afro-religioso. É dirigente do Templo Espiritual Caboclo Pantera Negra (Terreiro de Umbanda Omolokô) e do Ilé Ifá Ajàgùnmàlè Olóòtọ́ Aiyé. É Erìnmì Awo da cidade de Ìjágbó, Estado de Kwárà, Nigéria e o Líder (Olórí Ẹbí) da família de Ifá do Àràbà Olúsọjí Oyékàlẹ̀ para o Brasil. Especialista e Mestre em Ciência da Religião (ambas pela PUC/SP), Especialista em História da África e do Negro no Brasil pela UCAM/RJ; Bacharel e Mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública,  pelo Centro de Altos Estudos de Segurança; Especialista em Políticas Públicas de Gestão em Segurança Pública (PUC/SP). Endereço eletrônico: ezezide@gmail.com
[1] Termo que vem do árabe e quer dizer tradição. A utilização de termos árabes na Umbanda Omolokô demonstra a influência que os costumes malês (negros muçulmanos) tiveram na implementação dos cultos afro-brasileiros. Sunna é um étimo utilizado com a mesma significação de Orúkọ (nome iniciático) para o Candomblé Ketu.
[2] LOPES, Nei. A presença africana na música popular brasileira. Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/050/50clopes.htm. Acesso em 10/08/2010.
[3] KLOPPENBURG, Boaventura. Espiritismo: orientação para os católicos. São Paulo: Loyola, 2005, p. 40.
[4] KLOPPENBURG. Op. Cit., p. 41.
[5] CAPONE, Stefania. A busca da África no Candomblé: Tradição e Poder no Brasil. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria/Pallas, 2004, p. 134.
[6] FREITAS, Byron Torres de & PINTO, Tancredo da Silva. Fundamentos da Umbanda. Rio de Janeiro: Editora Souza, 1956, p. 19,
[7] BROWN, Diana. Uma historia da Umbanda no Rio. In: Umbanda e Política. Cadernos do ISER, n. 18, Rio de Janeiro, Marco Zero-ISER, 1985, p. 9-42.
[8] LUZ, Marco Aurélio. Cultura negra em tempos pós-modernos. Salvador: EDUFBA, 2008, p. 126.
[9] Nome de um das divindades do panteão Jeje, que se assemelha a Omolu.
[10] LOPES, Nei. A república “evangélica” do Brasil. Disponível em: http://www.neilopes.blogger.com.br/2008_09_01_archive.html. Acesso em 19/08/2010.
[11] LOPES, Nei. Tancredo, o General da Banda. Disponível em: http://www.neilopes.blogger.com.br/2008_08_01_archive.html. Acesso em 10/08/2010.

Caboclo Pantera Negra - O Guia Chefe do Templo Espiritual que leva seu nome

Caboclo Pantera Negra - O Guia Chefe




O Caboclo Pantera Negra se tornou o Guia Chefe do Templo Espiritual que leva o seu nome antes mesmo dele (o Templo) existir de fato. Por meio de uma consulta feita com o Owó Ẹyọ Mẹ́rìndílógún (Jogo de Búzios) o Bàbálòrìṣà Lúcio de Ògún disse a Mário Filho (seu ọmọ Òrìsà - "filho de Santo") que este deveria fundar um Terreiro e que o Guia Chefe seria o Caboclo Pantera Negra. Isso soou estranho, pois ele nunca havia se manifestado em Mário; ainda assim, Mário, com auxílio do Babalórìṣà Lúcio de Ògún, fundou o Templo e, nesta ocasião, ele se manifestou pela primeira vez e assumiu, verdadeiramente, o Templo, dizendo o que deveria ser feito para sedimentação da Casa e como seus trabalhos deveriam ser conduzidos, com algumas características diferente da forma como outras Casas de Umbanda realizam seus trabalhos.
Podemos dizer que o Caboclo Pantera Negra é uma entidade bastante enérgica, correta e ética. Conduz os trabalhos de Umbanda e dirige o Templo Espiritual, que leva seu nome, com muita desenvoltura e denodo. Seus conselhos são procurados por muitos, chamando-o de Pai, graças a sua grande sabedoria. Apesar de enérgico, consegue trazer alento àqueles que o procuram durante as consultas espirituais.
        
A Pantera Negra e sua relação com a religiosidade africana
Há dois tipos de felinos que são chamados de Pantera Negra: o leopardo (Panthera Pardus) ou a onça (Panthera Onca) que tem alto grau de melanina em suas peles o que lhes dá o nome de Pantera Negra. O primeiro é comum na África e na Ásia; o segundo nas Américas.
A Pantera Negra é um animal totêmico, assim como seu "primo" o Leão (Panthera Leo). É cultuado em diversas partes do mundo, simbolizando realeza, inteligência, força, rapidez e destreza. Em diversos cultos xamânicos a presença da Pantera Negra é observada. Seu simbolismo é tão forte e marcante que foi escolhida como símbolo de um grupo de defesa de direitos dos afro-americanos, chamado de "Panteras Negras" nos Estados Unidos. É, também, um herói em quadrinhos da Marvel Comics.
Pelizari diz que na região Sul do Brasil, principalmente, o Caboclo Pantera Negra é encontrado num grupo específico de Caboclos chamado de Caboclos Africanos. Ali ele se manifesta com o nome de Pantera Negra Africano, ao lado de Arranca-Caveira Africano, Arranca-Estrela Africano e Pai Simão Africano, entre outros. Lembra, ainda, que o Caboclo Pantera Negra pode ser encontrado no Haiti, no culto Voudu, como Agassou, sendo que sua representação é feita por um ser meio homem, meio leopardo. 
No Vodu haitiano se diz que Agassou é um Lwa (Loa), uma divindade que guarda as velhas tradições do Dahome (atual Benin), país de cuja tradição religiosa saiu. Diz-se que Agassou veio para a região do Haiti junto com os escravos negros, a fim de protegê-los no novo continente. Diz-se que  Agassou é muito temido, pois é profundamente justo e não perdoa os fracos de caráter.
Agassou, no Dahome, é um Vodun[1] gerado de um encontro divino entre a Princesa Aligbọnà e a pantera Gbékpò, por isso recebeu o apelido de Agassou, que quer dizer bastardo, entretanto seu nome verdadeiro é Kpòsú, conhecido no Brasil como Kposun, Possun ou Possum, cuja representação é uma Pantera e é cultuado no Candomblé Jeje. O nome Kpò em fongbe (uma das línguas faladas no Dahome) significa Pantera. O Vodun Kpò é associado, ao mesmo tempo, à família do Vodun Hevioso (Vodun do trovão) e da Vodun Áyízàn (Vodun da terra). É ligado à dinastia real do Dahome, sendo o patrono dos guerreiros e caçadores.
No Brasil o Caboclo Pantera Negra é, muitas vezes, confundido com Exu, no entanto ele é um Caboclo, que assim como outros Caboclos trabalha na chamada “linha de Exu”. Na Umbanda o Caboclo Pantera Negra é conhecido como o Chefe da linha dos Caboclos Quimbandeiros, o que lhe dá o “poder” e a "deferência" de trabalhar em diversas linhas de Umbanda e em outros cultos afro-brasileiros.
O Bàbálòrìsà Lúcio de Ògún, patrono do Templo Espiritual Caboclo Pantera Negra, dizia que o Caboclo Pantera Negra era o chefe de uma linhagem de Caboclos índios que eram oriundos de tribos isoladas e desconhecidas, sendo estes muito fortes, arredios e até brutos.

O Caboclo Pantera Negra e sua relação com os médiuns
Não há muitos médiuns que trabalham com o Caboclo Pantera Negra. Bàbá Lúcio dizia que os médiuns que o incorporam não costumam beber, falar demais ou serem covardes. Afirmava que eles são muito disciplinados e disciplinadores, verdadeiros guerreiros modernos.
Os médiuns que trabalham com o Caboclo Pantera Negra, por pedido do próprio Caboclo, costumam usar um bracelete de ferro no pulso esquerdo, dada à sua ligação com o Òrìsà Ògún.
Diz-se que poucos médiuns conseguem suportar a incorporação dele ou de outros espíritos da família das Panteras. É necessária muita preparação, firmeza de pensamento e moralidade. Do contrário, e isto realmente acontece, o médium terá problemas durante a incorporação. 
Em outras ilhas do Caribe, além do Haiti, também encontramos seguidores do Pantera Negra. Alguns o invocam como espírito indígena e outros como uma força africana, meio homem, meio felino.

As práticas em homenagem ao Caboclo Pantera Negra
         O Caboclo Pantera Negra aprecia em suas oferendas milho vermelho e feijão fradinho torrados, milho cozido, côco em pedaços pequenos, frutas silvestres, mel, água e charuto grande, robusto e de boa qualidade. O Caboclo Pantera Negra não recebe bebidas alcoólicas como oferenda. Esta é uma regra para todos os Caboclos Pantera Negra. As oferendas devem ser depositadas em encruzilhadas na mata ou aos pés de grandes árvores, podendo, em alguns casos, recebê-las no cemitério ou numa caverna escura no interior de uma mata densa e fechada.
O Caboclo Pantera Negra é um dos poucos Caboclos que é assentado e não firmado, esta também é uma regra comum a todos os Caboclos Pantera Negra. Seu assentamento costuma ser feito em potes de barro preenchidos com terra de cemitério de tribos indígenas, ervas específicas e outros elementos secretos, que são consagradas por Sacerdotes  de Umbanda ou de Kimbanda, iniciados nos mistérios desses poderosos espíritos benfazejos.
Suas cores representativas são o vermelho e o verde. Os médiuns que trabalham com o Caboclo Pantera Negra usam um fio de contas com três cores: vermelho, verde e preto, com uma firma preta. Não costuma usar o tradicional cocar indígena, fuma charutos robustos e bebe água.

Salve o Caboclo Pantera Negra!! Salve sua força!! Salve seus mistérios!!!!

[1] Vodun é o étimo fongbe que possui o mesmo significado que Orixá para os Ioruba.

O mistério da Macumba :  curiosas revelações sobre os ritos africanos no Brasil Por Carlos Alberto Nóbrega da Cunha (Matéria publicada n...